O custo oculto de eleger um liberal

A cada dia, fica mais aparente que o que vínhamos entendo como crise de representação pode ser, em boa parte, uma conquista da narrativa liberal que promove o sequestro do Estado e da ideia de Política apostando em sua desqualificação.

Em um país como o Brasil, o liberalismo econômico tem um grande desafio existencial: como conquistar hegemonia suficiente para vencer nas urnas sendo uma ideologia que interessa apenas a uma parte ínfima da população?

Mesmo com a construção incansável e vitoriosa de certas narrativas  –  investimento público vira “gasto”, políticos servem apenas a interesses próprios e “não me representam”, corruptores privados são vítimas -, ainda assim, é difícil acreditar que alguém se elegeria dizendo simplesmente que quer menos Estado.

E, no entanto, muitos governam exatamente dessa maneira. Elegem-se com um discurso de bem-estar social mas, depois, contam o conto da austeridade, ainda que sejam os mesmos há décadas no poder. Como é o caso do Estado de São Paulo.

Não é prometendo diminuir o que é público e alimentar os interesses privados que Geraldo Alckmin vem se elegendo governador de São Paulo há uma eternidade.

E, certamente, não será assim que se apresentará diante do Brasil. Mas esta é a política que pratica. Alckmin é um radical do liberalismo econômico que não fica nada abaixo de Michel Temer.

O Estado de São Paulo está sendo destruído pela política do caos, em que programas e equipamentos públicos são deliberadamente minguados para que possam, com mais facilidade, serem entregues à iniciativa privada.

Enquanto isso, um programa de desonerações sem qualquer transparência abre mão de um montante equivalente ao de áreas públicas essenciais.

Durante os últimos dois mandatos de Alckmin, a iniciativa privada recebeu mais de R$ 110 BILHÕES em exonerações.

É o suficiente para manter TODOS OS GASTOS DO ESTADO DE SÃO PAULO DURANTE SEIS MESES, sem colocar a mão no bolso.

Uma noção do peso dessas desonerações só é possível quando as comparamos aos números investidos pelo governo em áreas essenciais – e que o governo trata como “no limite”.

A desoneração prevista para 2017, por exemplo, foi de R$ 14,6 bilhões, o equivalente ao Orçamento anual de TODAS as maltratadas universidades paulistas, mais um “troco” de 40%.

É o equivalente a mais da metade de tudo o que se gasta com Saúde no Estado de São Paulo (25,3 bi). É mais do que pagamos anualmente para quitar a dívida pública do Estado (12,6 bi).

Pior: esses são os valores estimados, já que, segundo ressalva do próprio Tribunal de Contas do Estado, essas desonerações são obscuras, sem detalhes de quem e quanto recebe.

Nem TCE nem a Assembleia Legislativa sabem exatamente quanto Alckmin concedeu em benefícios fiscais e como esse privilégio é compensado pelas empresas.

Sem dados precisos sobre isso, como avaliar a contrapartida social desse dinheiro dados a empresários?

Será que há alguma?

O hoje governador Marcio França, que nos últimos três anos e meio foi, ao mesmo tempo, vice-governador e Secretário de Desenvolvimento do Estado, deu entrevistas  sobre a falta de valorização dos policiais civis e militares de São Paulo. Dizia que a categoria precisa ser valorizada e que tem planos para isso.

Enquanto França participava do governo, no entanto, os policiais não receberam sequer o reajuste inflacionário que a lei determina. Os delegados chegaram ao pior salário do país. O déficit de profissionais passou de DOZE MIL VAGAS.

Alguém pode argumentar que vice é um cargo decorativo, e que a pasta de França não era responsável por policiais. Pode ser.

Mas, como secretário, era responsável pela USP, que está hoje com o Hospital Universitário praticamente fechado e caindo em todos os rankings de avaliação; pela UNESP, que sequer consegue pagar o 13º salário a seus servidores e vive com a corda no pescoço; pelos professores das ETECs e Fatecs que há anos lutam para que o Estado pague, pelo menos, o piso mínimo nacional que a Justiça já determinou (e pensar que essas categorias já vinham de anos de arrocho sob Rodrigo Garcia…).

O custo de eleger um liberal está sempre ausente de seu discurso. Mas conduz suas ações.



 

 

João Paulo Rillo é deputado estadual (PSOL-SP)

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