Adivinhar ou construir o futuro, eis a questão para os líderes

O sucesso das empresas no futuro dependerá do “Capital Liderança”, capaz de transformar esse conhecimento em ideias, decisões e direcionadores estratégicos

Adivinhar ou construir o futuro, eis a questão para os líderes -


Imagem: Depositphotos

“Seu papel como líder do negócio não é ficar tentando adivinhar o futuro. Mas inventar o futuro!” Com essa frase, o experiente presidente do Conselho de Administração (CA) de uma grande empresa interrompeu o CEO que começava a apresentar seu plano estratégico para a próxima década.
Era a última reunião do ano e o líder do negócio havia iniciado sua fala enumerando possíveis cenários macro econômicos que antevia, por meio de um emaranhado de gráficos e números.
O presidente do CA foi adiante, dizendo que os acionistas e membros do Conselho estavam mais interessados na visão do CEO e da sua equipe sobre o futuro do negócio. “Como maximizar a rentabilidade dos negócios atuais e quais as oportunidades de investimento em novos negócios? Essa linha será mais produtiva do que ficar falando sobre informações especulativas de economistas que todos podem ler nos jornais e no noticiário”, concluiu.
O CEO insistiu em seu raciocínio, apoiado por pelo menos dois conselheiros independentes, alegando que conhecer o cenário aumentaria as chances de decisões mais acuradas. Rapidamente estabeleceu-se o clima de perde-ganha entre duas visões bem diferentes. Qual posição iria prevalecer?
Em situações assim, sempre recomendo a “sabedoria do E” em vez da “ditadura do OU”, inspirado em uma conversa informal que tive com Jim Collins, há mais de 20 anos, em Búzios, no litoral fluminense. Na ocasião, o pesquisador e consultor norte-americano estava no Brasil para o lançamento do best seller “Feitas para Durar”.
Desde então, insisto muito na busca da convergência entre perspectivas diferentes para, com isso, buscar um grau adequado de alinhamento em eventuais divergências.
O ponto ótimo aqui não é uma coisa “ou” outra. O ideal é não ficar apenas analisando cenários nem nos limitarmos a uma proposta de nova estratégia sem o devido embasamento das circunstâncias.
Então, propus dividirmos a reunião em duas fases. Inicialmente, uma breve troca de ideias na qual pudéssemos conversar sobre possíveis macrotendências que pudessem afetar os negócios da empresa. Outra parte, bem mais profunda, com o CEO apresentando sua visão e proposta sobre o próximo patamar da empresa e quais os direcionadores que pretende conduzir a organização nos próximos anos.
Isto porque é importante que os dirigentes de cada empresa estejam na mesma página sobre aspectos a serem monitorados no ambiente que podem repercutir nos negócios. Essa relevância cresce ainda mais nesse momento de grande turbulência e incertezas no cenário macro político, econômico, social e tecnológico.
Essa agenda de impactos a ser monitorada ao longo de 2021, certamente, deve incluir: acesso à vacina e eficácia do processo de vacinação; fabricação de um medicamento eficaz para combate à covid-19; capacidade de recuperação gradual da economia; possível aumento da taxa de inflação e pressão para elevação dos juros, que estão em patamar historicamente muito baixos.
Também precisa estar no radar a oscilação nos índices de desemprego; as taxas de câmbio e seu impacto nas contas, tanto das empresas importadoras de equipamentos e matéria-prima quanto nas empresas exportadoras de commodities; a disponibilização de auxílio emergencial e a consequente oxigenação no combalido poder de consumo da população de renda mais baixa.
Além disso, vale observar a nova dinâmica da inserção internacional do Brasil, especialmente suas relações com o novo governo dos Estados Unidos, bem como a atual exuberância do mercado acionário, cujo humor muito dependerá da capacidade do governo federal de aprovar as incertas reformas no Congresso.
Como se toda essa teia de fatores já não fosse suficiente, os dirigentes precisam estar muito atentos a nova realidade advinda do “Grande Tsunami de 2020”. A estratégia da maioria das empresas será afetada de uma forma ou outra pelas novas percepções e comportamentos dos consumidores na hora de escolher, comprar e utilizar produtos e serviços, além da nova forma das pessoas se organizarem e conviverem no ambiente de trabalho, incluindo o modelo híbrido com home office, que, seguramente, já afeta a forma de exercermos a liderança de equipes.
A tecnologia também tem dado sua parcela de contribuição para a necessidade de reinvenção dos modelos de negócios de várias empresas, pois, como já afirmei em artigo anterior nesta coluna, soluções disruptivas estão destruindo negócios tradicionais da noite para o dia. E apenas estamos começando um processo disruptivo, que será intensificado com o leilão do 5G, tecnologia revolucionária para a capacidade de processamento e transmissão de voz e imagens.
Tudo isso deverá gerar um sério embate no assunto de proteção à privacidade das pessoas, pois empresas e instituições conhecerão em detalhes nossos hábitos e, certamente, irão cruzar nossas ações na web para prever cada vez mais o que e de que forma desejamos consumir.
Some a esse conjunto a automação, mecanização, robótica, inteligência artificial e a internet das coisas (IoT). Essas vertentes substituirão muitas profissões. No entanto, novas ocupações surgirão.
A desintermediação progressiva será outro fator determinante, pois fabricantes em vários negócios poderão interagir diretamente com seus consumidores finais. Uma forte onda de startups forçará novas formas de as empresas tradicionais interagirem, de forma complementar, para buscar soluções inovadoras e integradas, com o crescente desenvolvimento de verdadeiros Innovation Hubs como solução “extra muros”.
Porém, conhecer essas macrotendências não é suficiente. O sucesso das empresas no futuro dependerá do “Capital Liderança”, capaz de transformar esse conhecimento em ideias, decisões e direcionadores estratégicos para definir o rumo e futuro de cada empresa. É aí que o líder de cada negócio faz a diferença.
Longe de um pensamento determinista, cabe ao líder não apenas conhecer as tendências que poderão afetar o seu negócio, mas, sem se deixar aprisionar por elas, inventar o futuro da empresa. Isso abrange criação do mercado e de novas circunstâncias. Nesse sentido, relembro as palavras do presidente do CA utilizadas no início deste texto. “Seu papel como líder do negócio não é ficar tentando adivinhar o futuro. Mas inventar o futuro!” Ambos tinham razão!

Chegou o momento de o CEO ir muito além de analisar tendências e cenários para propor, de forma assertiva, aos acionistas e ao CA um caminho claro sobre pontos cruciais:
• Qual o propósito da empresa?
• Qual posicionamento e atributos a serem sugeridos?
• Qual a visão da empresa para 2025? E a visão para 2030?
• Quais os resultados desejados para 2021, 2023 e 2025?
• Quais os negócios atuais e os novos negócios prioritários? E, talvez, quais negócios a serem descartados?
• Quais as competências necessárias para cumprimos a visão para 2025?
• Qual o mapa de atitudes que devemos estimular?
• Quais prioridades focar no curto, médio e longo prazos?
Essas reflexões e tudo o que elas envolvem representam o maior desafio atual para as lideranças. Com a palavra, os CEOs das empresas.

Fonte: IstoÉ Dinheiro




César Souza: Cofundador e Presidente do Grupo Empreenda. Membro Investidor do BR Angels. Membro do Conselho de Administração de diversas empresas e ONGs. Consultor, palestrante e autor de diversos bestsellers, com cerca de 500 mil livros vendidos, inclusive “Seja o Líder que o Momento Exige”. Foi considerado um dos 200 Global Leaders for Tomorrow, pelo World Economic Forum em Davos, Suíça. Souza é também Curador da Galeria de Líderes do Líder S/A. 

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