SBT analisa “Noite Passada em Soho”: o desperdício de um ótimo drama, para enfoque em um péssimo terror

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SBT analisa “Noite Passada em Soho”: o desperdício de um ótimo drama, para enfoque em um péssimo terror -


Um dos filmes mais aguardados da temporada, “Noite Passada em Soho”, traz de volta Edgar Wright para atrás das câmeras. Fato que já me deixou bastante ansioso para prestigiar o longa, visto que quase toda filmografia do britânico me agrada. Marcado por uma veia cômica latente em seus trabalhos, Wright tinha aqui uma difícil tarefa de dirigir um roteiro bem mais funesto.

Com uma introdução estonteante, somos apresentados à Elouise Turner (Thomasin McKenzie), uma jovem que acabara de ingressar em uma faculdade de moda na capital inglesa, onde sonha se tornar uma estilista de renome. Literalmente assombrada pela imagem da mãe, já morta vítima de suicídio, que possuía o mesmo sonho, a jovem denota possuir sensibilidades paranormais que se julgarão necessárias quando a narrativa necessitar criar um conflito. Após receber uma desalmada recepção de alguns colegas de dormitório, zombando de suas roupas autorais e desmerecendo a tragédia de sua mãe, Ellie decide se mudar, alugando o apartamento da rígida, porém calorosa senhora Collins (Diana Rigg), atriz pelo qual o filme homenageia em seus créditos de abertura.  Ainda se acostumando com a dura e visceral realidade da metrópole, Ellie, começa a se refugiar em seus sonhos, onde encarna a deslumbrante Sandie (Anya Taylor-Joy), uma jovem cantora que vivia em Londres em 1966.

A princípio, as sonambulas viagens décadas no passado para uma vistosa Londres recriada em um design de produção inegavelmente perfeito servem tanto como escape de uma realidade incômoda e sem muitas cores, quanto como laboratório de inspiração para Ellie, que começa um projeto de roupas inspirado na década em questão. Salientada por uma trilha sonora que conta, óbvio, com ícones daquele momento histórico, logo na primeira investida de nossa protagonista, somos também imediatamente imersos em uma realidade cheia de glamour que enche os olhos. Desde sempre, usando recortes do período como escudo para se blindar de um tempo a qual se sente deslocada, Ellie encontra seu paraíso, para o qual espera ansiosamente adormecer e desfrutar todos os dias na pele da poderosa e destemida Sandie.

Sob o gerenciamento de Jack (Matt Smith), Sandie parece ter uma carreira promissora à sua frente e um romance sessentista clássico a seu lado, o que torna os vislumbres de Ellie ainda mais excitantes. Jack então, logo se revela uma espécie de cafetão que utiliza suas influências e um charme Travoltiano, destaque para os passos de dança remetendo à Pulp Fiction, para seduzir aspirantes e talentosas jovens, para então negociá-las como objetos sexuais. Com Sandie não é diferente, a jovem percebe que sua promissora carreira acabara de se transformar em um pesadelo, tudo sendo acompanhado de camarote por Ellie, que sofre praticamente da mesma maneira que a garota em seus sonhos.






A partir daí que o filme começa se perder, transformando um promissor drama em um tecnicamente excelente, porém genérico filme de terror. O primeiro problema está na figura de Jack. Progressivamente, Sandie e consequentemente Ellie começam a temer cada vez mais o elegante e desumano sujeito, porém quem o deveria teme-lo, nós, não consegue nutrir tal sentimento, a seara fica mais no campo da indiferença. O roteiro não consegue transformá-lo em nada mais que um Bicho-Papão com um terno bem cortado. Além desde mau maior, Ellie, conforme realidade e devaneio se mesclam diante da garota, é assombrada por alguns outros fantasmas, homens ao qual Sandie fora forçada a se relacionar em seu terrível passado. Ou seja, esperem jump scares dos mais previsíveis e figuras monstruosas que não assustam nem o mais fracalhão dos espectadores.

Até mesmo na melhor cena do filme, apenas para elevar o horror da sequência, vale o destaque negativo para a escalação de Michael Ajo, o único e solitário personagem negro que ao final da noite de Halloween após tentar ajuda a protagonista a lutar contra seus demônios, acaba quase sendo acusado de estuprar uma mulher branca. Cineastas precisam entender que apenas o fato de escalar um ator negro não é suficiente, ainda mais com a história racial que possui uma cena como essa.

 Mesmo iniciando com temas relevantes, como fanatismo, homens e relacionamentos tóxicos, não há massa suficiente ali para carregar o filme. Wright simplesmente não tem muito a dizer sobre a indústria do sexo, os famigerados “testes do sofá” ou até mesmo sobre saúde mental, além de uma compreensão e exposição que não perfuram mais do que a superfície. Ao invés de apostar no drama de temas tão impactantes, o diretor confia em seu humor absurdo, litros de sangue e várias homenagens a filmes muito melhores.  Normalmente isso costuma funcionar na filmografia de Edgar Wright, mas aqui, devido à complexidade e profundidade dos temas abordados e intrínsecos na narrativa, tais características do diretor não são suficientes para preencher tais lacunas.

“Noite Passada em Soho” tecnicamente é estupendo, possui um design de produção que recria de forma glamourosa uma Londres dos anos 60, uma fotografia que se altera entre calorosa e sensual no passado e pálida e sem vida no presente, com uma transição utilizando um neon que deixa o evento ainda mais estiloso. E mesmo com uma trilha sonora matadora, a história de Ellie parece uma grande coincidência incompleta que desmorona em tédio e em uma reviravolta que não irá surpreender ninguém.

Nota do Crítico: 4.0

Nota Média do Público (IMDb): 7.3

Horários das Sessões Cineflix em Araçatuba, Shopping Praça Nova:

Dublado: 19h20
Legendado: 21h50
Classificação Indicativa: 16 anos

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