SBT analisa “Viúva Negra”: o filme certo no momento errado

O filme é um pouco menos Marvel do que de costume

SBT analisa “Viúva Negra”: o filme certo no momento errado -


Por diversas razões, “Viúva Negra” precisou ter a estreia adiada e no último dia 9, os estúdios Marvel lançaram simultaneamente nos cinemas e no serviço de streaming Disney+ o primeiro filme solo da heroína russa. Após assistir ao filme, a sensação que fiquei foi de que mesmo que fosse lançada na primeira data prevista, em Maio de 2020, o longa não conseguiria fugir de deixar imposto o sentimento de adiamento. Isso porque, mesmo sendo um dos pilares para criação dos Vingadores, Natasha, mesmo com a sequência impactante e um sacrifício carregado de emoção em “Ultimato”, ainda não havia tido seu momento solo para leva-la ao cânone do universo e da franquia. Restava então, dar este momento a fiel vingadora, que havia sido deixada de lado dos holofotes para seus parceiros brilharem, com uma aventura que faz jus a ótima personagem, mas soa atrasada.

O filme abre com uma breve mostra e contextualização da infância da, posteriormente, vingadora, mostrando os laços aparentemente muito verdadeiros entre aquela família, o amor do pai Alexei (David Harbour), a proteção da mãe Melina (Rachel Weisz) e a amizade inocente das irmãs Natasha e Yelena, que precisam fugir dos Estados Unidos, após o patriarca, ter feito uma descoberta que valesse a morte de toda sua família caso fossem pegos. Durante a perseguição, descobrimos que aquelas pessoas não são apenas mais uma família do subúrbio de Ohio, mas sim, que escondem segredos maiores que suas próprias vidas. Levando a tal descoberta para seus mandatários, a “família” é desmantelada, separando as duas garotas, ainda crianças, e as levando para o que seria o local onde Natasha adquiriria todos os conhecimentos de luta, espionagem e manipulação que a tornariam a maior espiã do mundo.

Somos lançados 21 anos no futuro e após os eventos de “Capitão América: Guerra Civil”, Natasha (Johansson) está em fuga do próprio governo, após violar o tratado de Sokovia, quando recebe um pacote da irmã Yelena (Florence Pugh) contendo uma espécie de gás que quando entra em contato com as vias nasais do individuo, inibe a subjugação química que torna as viúvas tão obedientemente devotas ao líder do programa “Viúvas Negras”: Dreykov (Ray Winstone). O plot intencionalmente revela o oposto do visto na série “Falcão e o Soldado Invernal”, onde ao invés de um produto que transforma pessoas comuns em máquinas de matar, aqui o “supersoro” tem em vista transformar as máquinas de matar de volta em pessoas comuns. Logo após receber o conteúdo, Natasha é atacada e precisar ir ao abrigo da irmã que fica na sempre citada, Budapeste. Durante o encontro, fica claro que a separação das garotas afetou diretamente a relação das irmãs, sendo que, enquanto a mais velha, escapou das amarras do mau e floresceu como uma das maiores heroínas que o planeta conhece, a mais nova permaneceu no anonimato, onde sofrera todas as dores físicas e emocionais do processo de se tornar uma espiã do calibre de uma viúva e sendo completamente manipulada pelo chefão russo, onde todo o afeto mostrado no prólogo do filme, como não poderia ser diferente, havia se esvaído de Yelena. Após um embate no famigerado apartamento de Budapeste, as duas percebem que devem deixar de lado suas diferenças e trabalhar juntas para acabar com Dreykov e libertar todas as, milhares, de garotas que estão sob seu maléfico comando. Decidem então “resgatar” Alexei de uma prisão, pois, claro, ele tem alguma função específica e necessária para que o plano das espiãs funcionem, o mesmo acontece com Melina (Weisz) reunindo novamente aquelas pessoas que um dia, mesmo que de forma forçada, foram uma família, para acabar com o império de maldade de Dreykov e destruindo a “sala vermelha, onde o russo articula seus comandos, que é indetectável, mesmo sendo uma espaçonave colossal barulhenta que se move no céu.

Mesmo com “Velozes e Furiosos 9” tendo clamado pelo significado da  palavra “família” tanto temática quanto foneticamente, “Viúva Negra” tem em seu plano de fundo as mesmas questões: traição, afeto, empatia e sacrifício familiar. Isso ao fundo de um sólido filme de espionagem, as escolhas da diretora Cate Shortland tanto visuais quanto narrativas, remetem muito á inspirações de obras do gênero dos anos 80, mas a ação visceral mano a mano é coreografada de forma mais “contemporânea” e a mescla funciona muito bem dentro do título, que une bem o charme de um “007” e a adrenalina de um “Missão Impossível”, proporcionando sequências de ação bem coreografadas e muito satisfatórias, pecando apenas em seu terceiro ato onde a grandiloquência fala mais alto e a escala é aumentada de uma forma bem maior do que deveria e precisava.






“Viúva Negra” poderia ter o impacto emocional similar a de “Capitão América: Soldado Invernal”, mas por sofrer desde lapso de tempo perde um pouco seu peso dramático e mesmo com um bom elenco no papel, os personagens são de certa forma, subaproveitados, como é o caso do Guardião Vermelho (Harbour) que, bem como, seu papel no plano da dupla protagonista, tem sua função muito bem definida desde o princípio: tentar incessantemente imprimir a “fórmula Marvel”  com piadas deslocadas e desnecessárias em meio a momentos que o que menos se pede é humor. Ou Melina (Weisz) que tem motivações genuínas para estar em ambos os lados e poderia tranquilamente gerar um arco à sua volta, mas isso é exposto em tela apenas em uma, acertada, mas abrupta decisão da mesma. Completando o elenco principal, temos Natasha (Johansson) que encarna a espiã com maestria, aqui, talvez por ser um filme dirigido por uma mulher, a personagem está um pouco menos sexualizada, a beleza estonteante da atriz continua presente, tais traços aparecem por serem impossíveis de não serem notados e não porque a diretora tem a intenção de mostrá-los. Mas o destaque interpretativo, e até estético vai para a, sempre ótima, Florence Pugh, aliás, deve-se adicionar a “fórmula Marvel” a eficácia sempre certeira de escalar elenco, pois aqui o encaixe é perfeito. Por diversos momentos a nova aquisição do universo salta na tela chegando ao ponto, do qual eu achava ser impossível, ofuscar o holofote de Scarlett Johansson. Pelo lado vilanesco, Ray Winston é um chefão todo genérico, tanto a caracterização física quanto as motivações. Orga Kurylenko, poderia ser substituída por qualquer pessoas do planeta, não tem uma linha de diálogo e sua, descaracterizada, personagem é completamente incorporada por um dublê, que, pelo menos, gera fan services ao público em seus momentos de batalha referenciando diversas coreografias de lutas icônicas de outros grandes heróis do passado.

O roteiro poderia se aprofundar um pouco mais nas questões dramáticas que apresenta até mesmo a questão familiar, mesmo que funcional é feita de forma tão curta que os descontentamentos e problemas apresentados somem de forma repentina demais. O filme flerta com a temática de exploração e empoderamento feminino, mas a intenção fica apenas no flerte.  “Viúva Negra”, conta com uma excelente dupla de protagonistas e consegue ser sólido como filme solo, mas também, como não podia ser diferente, mostra o futuro daquele mundo em uma cena pós-crédito. Mas se a intenção era canonizar a personagem tão importante para a franquia, esse filme foi perfeitamente escolhido, uma pena que com, pelo menos, cinco anos de atraso.

Nota do Crítico: 6.0

Nota Média do Público (IMDb): 7.0

 

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