SBT elenca os 10 melhores filmes da década

JOÃO MARCELO MORAES - DE ARAÇATUBA

 

O que faz um filme ser ótimo?

A subjetividade desta pergunta foi o que me fez demorar quase 25 dias para pensar e terminar esse texto.

Pode ser o roteiro, o apego a categorias técnicas, o valor de entretenimento, o poder das interpretações, uma grande direção, a mensagem do filme. Para mim é o montante disso tudo e, claro, gosto pessoal, não posso ser hipócrita e não levar isso em consideração.

Foram 100 filmes pré-selecionados, sendo tirados de cinco em cinco até chegarmos aos 10 melhores filmes da década.

Antes de entramos na lista, vamos, primeiramente as cinco menções honrosas:

Django Livre (2012) direção: Quentin Tarantino
Cisne Negro (2010) direção: Darren Aronofsky
Mad Max – A Estrada da Fúria (2015) direção: George Miller
Divertidamente (2015) direção: Pete Docter
12 Anos de Escravidão (2013) direção: Steve McQueen

Agora sem mais delongas, vamos listar os 10 melhores filmes dos últimos 10 anos.

10- ‘Roma’ (2018) direção: Alfonso Cuáron



Este é o filme desta lista que melhor usa a ferramenta cinematográfica para retratar a condição humana. É uma obra que retrata o cotidiano e a realidade de forma íntima, tem um discurso pertinente e muito bem usado sofre diferença de classes, nunca ficando superficial demais ou apelativo demais.

Mas é quando precisa se mostrar tecnicamente que ‘Roma’ chega a seu ápice de qualidade. O filme conta com uma imersão pouco vista, tem alguns planos sequência incríveis, um em especial usando lateralidade de câmera que deve ter sido extremamente difícil de fazer, o nível de coreografia aqui está em outro patamar de cinema. A edição de som é esplêndida, dá para ouvir o mar e o varrer de uma vassoura ao mesmo tempo, por exemplo. A fotografia é perfeita e tem dois momentos envolvendo um avião que é apenas o diretor gabando de seu talento.

Com atuações fortes, destaque para a Yalita Aparicio que demostra muito bem a subjugação devido a sua posição hierárquica na casa, há momentos em que as palavras quase não saem da boca dela por conta disso.

O problema aqui é o ritmo, o filme não tem muitas reviravoltas, afinal o cotidiano é mesmo tedioso. Por essa falta de teor de entretenimento e o filme não ser para todo mundo, ‘Roma’ está em décimo lugar na lista.

 

9- ‘La La Land – Cantando Estações’ (2017) direção: Damien Chazelle



Se um musical consegue fazer uma pessoa que detesta musicais se apaixonar, tem algo ali.

O filme é antes de tudo uma grande homenagem aos musicais dos anos 40 e 50.

O longa conta com uma rebeldia artística inquietante, uma fluidez de movimentos pura, uma musicalidade excitante e cores vibrantes que o deixam esteticamente estupendo.

Mesmo com todas as suas referências e similaridades, o filme nunca dá a sensação de ser uma imitação.

A direção aqui é apenas em favor das sequências, muita fluidez, muitos planos abertos para evitar cortes desnecessários e planos sequência maravilhosos. Se já é difícil executar um plano sequência, em um musical então, o trabalho é extremamente árduo e só a sequência de abertura já deveria ser o suficiente para ter lugar na lista.

As atuações de Emma Stone (vencedora do Oscar de melhor atriz pelo papel) e Ryan Goslin são apaixonantes, sem falar que a química do casal é uma mistura perfeita de charme, afeto e ardor.

O filme ainda traz uma discussão inquietante: o que é mais importante, o amor ou seus sonhos? 

‘La La Land – Cantado Estações’ é esteticamente lindo, tem um design de produção sublime, sequências musicais abrasadoras, um dos melhores casais da década, atuações magníficas, uma história de amor verdadeira e é o melhor musical dos últimos tempos, vale o nono lugar na lista.

8- ‘Relatos Selvagens’ (2014) direção: Damián Szifron



Poucas antologias proporcionam uma experiência tão visceral, enervante e satisfatória quanto este filme.

‘Relatos Selvagens’ usa muito bem o cinismo em suas histórias e parece entender de forma perfeita que a melhor comédia vem da tragédia, mas sem nunca ficar lúgubre demais. E é o controle do diretor sobre essas duas características que deixa o tom do filme perfeito.

Pode-se argumentar que o filme é ‘’mentiroso’’ demais, mas isso não é um defeito da obra e sim sua melhor qualidade. O longa sabe muito bem explorar e transmitir o ápice do extremo do comportamento humano, são situações ordinárias, mas levadas, propositalmente, ao absurdo que fizeram ‘Relatos Selvagens’ entrar na lista.

São seis histórias, nenhuma delas conectadas entre si e até a mais fraca delas é muito boa. É totalmente impossível não se identificar com, pelo menos, um dos personagens, se colocando em determinada situação e se pegar pensando ‘’o que eu faria se isso acontecesse comigo? ’’.

O elenco é fortíssimo, Ricardo Darín, Leonardo Sbaraglia, Érica Rivas, Rita Cortese. As interpretações são incríveis, em, pelos menos, um dos segmentos se tem um destaque dramático.

‘Relatos Selvagens’ é um filme que funciona em todos os seus aspectos e camadas, é incansavelmente engraçado, possui uma direção forte, interpretações mais fortes ainda, cinematografia e trilha sonora irretocável e é o filme que melhor trabalha a ideia do ‘’e se.…’’. Merece o oitavo lugar na lista.

7- ‘Melancolia’ (2011) direção: Lars Von Trier



Acho que pela primeira vez em sua filmografia o diretor deixa o onanismo para si próprio de lado e consegue equilibrar o real e o alegórico perfeitamente na balança.

A história que, aparentemente, é simples (de um planeta que vai colidir com a Terra) pode ser interpretada de diversas maneiras, mas sem ficar a sensação de que a narrativa é digressiva demais.

A direção é firme, o diretor não perde tempo sendo indulgente, como em trabalhos anteriores. O uso de câmera lenta aqui deveria ser copiado, sim copiado descaradamente, porque é o melhor uso de tal recurso que eu já vi, pelo menos, nos filmes da última década.

O filme é um grande estudo de como as pessoas encaram de forma inevitável a própria morte. Aborta temas como medo, aceitação, rejeição e indiferença da forma mais perfeitamente sensível. Sem falar que conta com o retrato mais fiel e real de uma pessoa com depressão que eu já vi no cinema. O diretor sabia exatamente o que estava fazendo ali. Lars Von Trier pode ser muito maluco, mas aqui provou que é tão genial quanto.

6- ‘Whiplash – Em Busca da Perfeição’ (2014) direção: Damien Chazelle



É incrível como a edição deste filme consegue utilizar as batidas tanto narrativas e musicais para ditar as sensações de seu protagonista, sendo elas felicidade ou sofrimento.

Mesmo com uma montagem beirando a perfeição, se não for perfeita, quem manda no filme é  J.K Simmons. É, certamente, uma das melhores interpretações da década. A manipulação que o personagem faz para com espectador é incrível. Quando você acha que ele é tal coisa, num estalar de dedos ele se transforma em uma outra pessoa completamente diferente, manipulação de expectativa não fica melhor do que isso.

‘Whiplash – Em Busca da Perfeição’é um filme excitante, doloroso de se ver (no bom sentido), tem interpretações espetaculares, uma montagem magnífica, uma musicalidade instigante e contanto com um roteiro extremamente bem escrito, o filme nos brinda com uma discussão pertinente, mas possivelmente sem resposta certa: ‘’até que ponto se deve ir para atingir glória? ’’. Sexto melhor filme da década.

5- ‘Antes da Meia Noite’ (2013) direção: Richard Linklater



Aqui temos o desfecho perfeito para a, discutivelmente, melhor e mais envolvente história de amor da história do cinema.

‘Antes da Meia Noite’ termina a trilogia de Linklater da maneira, novamente, perfeita. Com diálogos verossímeis, discussões de casal verdadeira, que vão de trabalho, amor, tratamento para com os filhos, para um com o outro, o desenvolvimento do amor da relação e muito mais.

O filme ganha nas entrelinhas, não é no grandioso que o longa acerta e sim no menor dos detalhes, o diretor consegue deixar o mero trivial a coisa mais importante do mundo sem parecer forçado. São nos longos planos sequência repletos de verborragia que está a magia aqui.

O diretor consegue transmitir a ideia que mesmo diante de toda a beleza daquela relação construída nos últimos 13 anos, não existe a ideia de casal perfeito e filme acentua isso, mostrando com uma dicotomia irônica do ‘’casal perfeito’’ em tela.

‘Antes da Meia Noite’ é sensível, lindo, tocante e quando um filme não parece ser um filme, você percebe que ele é realmente especial e por isso ele está em quinto lugar na lista.

4- ‘Moonlight – Sob a Luz do Luar’ (2018) direção: Berry Jenkins



Eu ainda não consigo explicar como o diretor conseguiu exprimir o MESMO tipo de sentimento do olhar de dois atores, interpretando o mesmo personagem, mas com 20 anos de diferença. É visível as marcas no Chiron adulto devido a infância e adolescência sofrida e conflituosa do protagonista.

Por passar em três linhas temporais, infância, adolescência e fase adulta do protagonista, o filme poderia ter um teor episódico, mas não aqui, o ritmo e a fluidez narrativa são impostos de tal forma que em nenhum momento fica essa sensação.

‘Moolight’ é um drama diferente, retrata questões de conflito de identidade com liricismo e a poesia deste filme acentuada por uma cinematografia quase poética e uma trilha sonora a base de música clássica.

O filme ainda trata questões como sexualidade, amor, rejeição, negação e aceitação da forma mais eloquente possível.

O longa é o melhor estudo de personagem da década e retrata de forma perfeita a dificuldade de encontrar sua identidade e todos os percalços de controlá-la. Quarto lugar na lista.

3- ‘Boyhood – Da Infância à Juventude’ (2014) direção: Richard Linklater



Este filme foi filmado em 12 anos, 12 ANOS!!!!

É maravilhoso ver o desenvolvimento não só dos personagens, mas sim dos atores. Não tem como explicar de outra forma, é lindo demais assistir a vida de uma pessoa sendo mostrada diante de uma tela. Mesmo sendo a vida do personagem, não tem como se apegar as mudanças físicas e até dramáticas dos atores.

Os lapsos de tempo mostrando a evolução dos personagens são feitos de forma perfeita.

Se você é uma dessas pessoas que reclama do filme por ele não ter uma ‘’história’’, das duas uma, ou você é maluco ou não entendeu nada do filme. A falta de uma história é o que torna o filme tão íntimo, ele não quer te contar algo grandioso ou inovador, o filme quer que mostrar a casualidade do cotidiano durante 12 anos da vida daquelas pessoas e o faz de forma estupenda.

É impossível não se identificar com o filme, independente da sua idade. Mudança de cidade, primeiro amor, descobrimento da sexualidade, está tudo ali.

A montagem é precisa. Mostra o que precisa ser mostrado, no tempo que precisa ser mostrado, sem se apressar e sem se alongar demais.

‘Boyhood’ é a melhor representação de eventos mundanos e da vida que o cinema já proporcionou, vale o terceiro lugar da lista.

2- ‘O Quarto de Jack’ (2015) direção: Lenny Abrahamson



Tudo nesse filme é feito com um único propósito: fazer o espectador sentir o filme e mesmo a pessoa mais fria do mundo se renderia a este espetáculo emocional.

Desde a cinematografia coibida e proibitiva, enquadramentos e planos claustrofóbicos, um design de produção que consegue te colocar naquela situação, o que é ao mesmo tempo incrível cinematograficamente falando, mas também horrível poder ter aquele tipo de sentimento e principalmente o horror de saber que tal tipo de coisa acontece na vida real.

Os primeiros 50 minutos deste filme são quase insuportáveis de se assistir, eu não me lembro de nenhum filme que tenha me causado isso, mesmo terrores gore. Mas a jornada que você é levado é totalmente compensatória.

A transição do primeiro ato é a coisa mais tensa que eu já vi na vida.

Em 20 segundos de filme você já está torcendo para os protagonistas e sente tudo junto com eles.

Jacob Tremblay maravilhoso e Brie Larson PERFEITAMENTE IRRETOCÁVEL. Segundo lugar na lista.

1- Blade Runner 2049 (2017) direção: Denis Villeneuve



Só por ser a sequência de um dos maiores clássicos de ficção científica que o cinema já proporcionou e ser ainda melhor que o original, este filme tinha que estar no lugar mais alto do pódio.

A direção é espetacular, adjetivo que também concedo ao diretor, e subversiva em questões como tom, gênero e narrativa.

A criação de mundo é tão inventiva quanto a do original, mas em uma escala bem maior, some isso a uma cinematografia que manipula as cores e que quer dizer algo sobre seus personagens, uma estética future noir, uma trilha sonora pulsante e temos o filme visualmente mais bonito que eu me lembre.

O longa não cai na armadilha de se vender ao público médio e tentar ser um blockbuster, são quase três horas de filme, onde o diretor não se apressa em nada e mesmo assim o ritmo é consistente e funciona.

O cuidado com as composições visuais aqui é de outro mundo, a misancese é de cair o queixo, dá tranquilamente ver filme uma segunda ou terceira vez apenas para acompanhar os elementos da linguagem cinematográfica, o quão sensível é o diretor para com sua obra.

‘Blade Runner 2049’ aumenta a riqueza de seu antecessor e ainda discute novas questões ainda mais filosóficas e existencialistas e é tudo que um apaixonado pela sétima arte espera ver quando vai ao cinema. É por essas e outras que eu o considero o melhor filme da década.

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