Sobre IA, empregos e disrupção social

Sobre IA, empregos e disrupção social -


Há raras tecnologias que de tempos em tempos surgem de forma tão avassaladora que provocam profundas mudanças na dinâmica social. São aquelas que os economistas chamam de tecnologias de propósito geral (GPTs), que alcançam diversas áreas e abrem novos campos do conhecimento. O motor a vapor do século 18 foi uma GPT, assim como a energia elétrica a partir da invenção do dínamo no século seguinte e, mais recentemente, a internet.

Hoje testemunhamos o avanço de uma tecnologia com potencial de disrupção socioeconômica, a inteligência artificial (IA). Esse conjunto de sistemas e algoritmos que permitem máquinas analisar, aprender e tomar decisões sozinhas se desenvolve em um mercado que deve passar dos US$ 15 trilhões até 2030, conforme previsão da PwC. E do mesmo jeito que um dia ocorreu com as GPTs que citei antes, a IA levanta a questão: As máquinas inteligentes acabarão com os empregos do ser humano?

Dois grupos dominam o debate. Os tecno-otimistas defendem que previsões catastróficas para o emprego na era da IA não passam de uma falácia. Eles têm a história ao lado. Na revolução industrial, por exemplo, camponeses substituídos por máquinas na agricultura foram absorvidos nas fábricas das cidades.

Do outro lado estão os que tratam a IA como uma tecnologia diferente, pois está entrando na vida das pessoas de forma muito mais rápida do que qualquer outra na história. Kai-Fu Lee, um dos maiores investidores da China em inteligência artificial, estima que em meados da década que vem soluções de IA poderão substituir, tecnicamente, até metade dos empregos nos EUA.

Tecnologias como o motor a vapor e a eletricidade alteraram fundamentalmente a natureza do trabalho manual, pois permitiram que o trabalhador comum assumisse tarefas que antes exigiam alta qualificação, enquanto a internet fez o mesmo com certos tipos de trabalho intelectual. A inteligência artificial, no entanto, vai modificar ambas as esferas ao mesmo tempo.

Máquinas dotadas de IA realizarão trabalhos tanto físico (procure pela Boston Dynamics) quanto intelectual com velocidade e potência incrivelmente superiores a qualquer ser humano. E funcionarão 24 horas por dia, sete dias por semana, sem férias.

Além disso, o choque da IA nos empregos deve ignorar a distinção entre trabalhadores pouco e muito qualificados. Tanto funções como operador de caixa e motorista de caminhão quanto profissões como contador e médico radiologista correm risco. Nesse processo transformador, intenso e abrangente muitos ficarão para trás e, dizem alguns pensadores, formarão a nova classe de seres humanos inúteis – aqueles que nunca mais conseguirão se ocupar.

Quem sofrerá mais com a ruptura será, justamente, o conjunto de países em desenvolvimento, como o Brasil, em que a competitividade global se fundamentou até agora na mão de obra barata em relação às nações desenvolvidas. Com a IA, as economias ricas encontrarão substitutos mais em conta.

Então, se prepare, pois o pleno emprego será realidade para robôs, não para você.

Por Wladimir D’Andrade, jornalista, empresário e especialista em inovação

Foto: user6702303 - br.freepik.com

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