Os quatro maiores gargalos do transporte marítimo mundial

Porta-contêineres que bloqueia Canal de Suez coloca em evidência as vulnerabilidades do comércio global. DW apresenta as principais rotas marítimas sujeitas a riscos de eventos inesperados.

Os quatro maiores gargalos do transporte marítimo mundial - Maxar Technologies/AP/picture-alliance


O Ever Given, um navio de transporte de contêineres de 400 metros de comprimento, está encalhado no Canal de Suez, no Egito, desde a terça-feira (23/03), travando uma via de transporte marítimo vital entre a Ásia e a Europa. A interrupção do tráfego de navios pelo canal trouxe novos problemas ao comércio mundial, já comprometido pela pandemia de covid-19.


Dezenas de embarcações, incluindo diversos petroleiros, estão agora esperando em ambos os lados do canal, segundo dados marítimos da Refinitiv. Muitos outros foram redirecionados, o que pode alongar a viagem em até 15 dias.

Nesta sexta-feira, a agência de notícias Reuters informou que tentativas de desencalhar o navio falharam, e que a solução pode ainda levar diversas semanas. Condições climáticas desfavoráveis podem complicar ainda mais a dragagem de areia no entorno da embarcação.

O bloqueio pode custar ao comércio global de 6 a 10 bilhões de dólares por semana (R$ 34,5 a 57,5 bilhões), segundo análise da seguradora alemã Allianz. O custo do frete marítimo de petróleo e derivados já duplicou, e atrasos nas cadeias de fornecimento globais, inclusive da indústria automotiva, podem acarretar aumento dos preços ao consumidor.

Contudo o Canal de Suez não é o gargalo mais vulnerável do comércio mundial. A DW analisa os quatro estreitos que poderiam ameaçar uma forte retomada econômica após a pandemia.

Estreito de Ormuz

A passagem marítima entre o Golfo Pérsico e o Golfo de Omã, que leva ao Oceano Índico é o gargalo mais crítico para o transporte de petróleo e gás natural. Com 167 quilômetros de comprimento, cerca de um quarto do transporte mundial marítimo de petróleo e um terço do de gás natural liquefeito passa pelo Estreito de Ormuz.

A rota é especialmente vulnerável devido à geopolítica do Oriente Médio. O estreito conecta diversos países que são protagonistas importantes no mercado de petróleo, incluindo Arábia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Iraque.

A largura da do Estreito de Ormuz é de cerca de três quilômetros, o que significa que o canal pode ser facilmente controlado durante um conflito. Durante a guerra entre Irã e Iraque, de 1980 a 1988, os dois países tentaram dificultar as exportações de petróleo do adversário agindo no estreito.

Teerã já ameaçou diversas vezes intervir no transporte de petróleo no estreito como retaliação às sanções americanas contra o país. Os iranianos já ameaçaram inclusive instalar minas na passagem.

Em maio de 2019, quatro navios, incluindo dois petroleiros sauditas, foram atacados na costa dos Emirados Árabes Unidos. Em janeiro de 2021, o Irã capturou um petroleiro de bandeira sul-coreana nas águas do estreito e deteve sua tripulação.

Estreito de Malaca

Com 900 quilômetros de comprimento, o Estreito de Malaca é o principal gargalo da Ásia e uma das rotas marítimas mais congestionadas. O canal liga o continente ao Oriente Médio e à Europa, e por ele passam cerca de 40% do comércio mundial. Mais de 100 mil navios o atravessam por ano.

Em seu ponto mais estreito, em Cingapura, ele tem apenas 2,7 quilômetros de largura, criando um gargalo natural e uma área propícia a colisões, encalhamentos ou derramamentos de óleo.

Cerca de 16 milhões de barris de petróleo passaram pelo canal em 2016, fazendo dele a segunda passagem de combustíveis mais relevante do mundo. O estreito tem importância estratégica crescente para Pequim. Cerca de 80% das importações de petróleo cru da China passam por ele, provenientes do Oriente Médio e da África.

Canal de Suez

A passagem aquática artificial conecta o Mediterrâneo ao Mar Vermelho e evita que os navios tenham que passar pelo Cabo da Boa Esperança, na África do Sul. O Canal de Suez economiza cerca de 8,9 mil quilômetros da viagem marítima.

O governo egípcio o expandiu em 2014, o que permitiu praticamente dobrar o número de navios que podem usá-lo por dia, de 49 para 97. Apesar disso, alguns superpetroleiros não podem utilizá-lo, tendo que descarregar parte do óleo em navios menores e depois serem recarregados na outra ponta.

Cerca de 12% do volume do comércio global passou pelo canal em 2020: segundo a autoridade responsável, um recorde de 18.880 navios, levando mais de 1 bilhão de toneladas de carga.

A passagem também é considerada vulnerável a instabilidades políticas no Oriente Médio, especialmente no Egito. Contudo, a Primavera Árabe e a queda do presidente Hosni Mubarak, em 2011, tiveram pouco impacto em no seu tráfego. Em 2013, Cairo declarou ter evitado um ataque a um navio de transporte de contêineres, com o suposto objetivo de atrapalhar o fluxo de embarcações no canal.

Canal do Panamá

Com 80 quilômetros de extensão, o Canal do Panamá atravessa a parte mais estreita do país americano e conecta os oceanos Atlântico e Pacífico. É uma das rotas mais congestionadas do transporte marítimo, por onde passa cerca do 5% comércio mundial. Aproximadamente 14 mil travessias foram feitas no canal em 2020.

Em 2016, o Panamá inaugurou uma expansão que custou 5,4 bilhões de dólares e que atrasou diversas vezes. A obra triplicou o tamanho máximo dos navios que podem atravessar o canal. Em teoria, 98% das embarcações agora podem utilizar a passagem e evitar o longo e perigoso Cabo Horn, no extremo meridional da América do Sul.

Apesar de o canal não estar vulnerável aos mesmos riscos geopolíticos de outros gargalos, a pandemia da covid-19 e condições climáticas adversas criaram obstáculos nos últimos meses, que atrasaram o tráfego de navios porta-contêineres e o fornecimento de gás natural liquefeito e de gás de petróleo liquefeito partindo do Golfo do México.