O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, "lamentou profundamente" nesta segunda-feira (17/07) a decisão da Rússia de se retirar do acordo de grãos do Mar Negro. Segundo Guterres, centenas de milhões de pessoas mundo afora que já sofrem com a inflação de alimento "vão pagar o preço" dessa decisão.
"Lamento profundamente a decisão da Federação Russa de encerrar a implementação da Iniciativa do Mar Negro – incluindo a retirada das garantias de segurança russas para a navegação na parte noroeste do Mar Negro", disse o líder da ONU, em comunicado.
"Centenas de milhões de pessoas passam fome, e os consumidores enfrentam uma crise global de custo de vida. Elas vão pagar o preço", afirmou Guterres, acrescentando que a decisão do governo russo "será um golpe para as pessoas necessitadas em todos os lugares".
Saída russa
Mais cedo, o Centro Conjunto de Coordenação estabelecido em Istambul para gerir o acordo para a exportação de grãos da Ucrânia através do Mar Negro foi notificado de que a Rússia estava se retirando de "forma imediata" dessa iniciativa, que permitiu a exportação de mais de 32 milhões de toneladas de grãos da Ucrânia para 45 países em três continentes enquanto o país era acossado pelas forças invasoras russas.
Segundo a ONU, os grãos produzidos na Ucrânia se transformam em alimento para 400 milhões de pessoas em todo o mundo. Por isso, quando a Rússia invadiu o país vizinho em fevereiro de 2022, muitos países apontaram o risco de aumento da fome, e a insegurança alimentar se acentuou especialmente na África e no Oriente Médio.
A Rússia e a Ucrânia chegaram a esse acordo há um ano com a mediação da ONU e da Turquia, que nas últimas semanas multiplicaram os seus esforços para conseguir uma nova prorrogação do acordo. O pacto expirou nesta segunda-feira após duas prorrogações, nos meses de março e maio.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, havia dito na semana passada que discutiu e concordou com o mandatário russo, Vladimir Putin, sobre a necessidade de estender o acordo, em meio a críticas de representantes do Kremlin de que a parte do pacto que deveria facilitar a exportação de alimentos e fertilizantes russos foi sistematicamente negligenciada.
O acordo foi negociado em meio à crise alimentar desencadeada pela interrupção, como resultado da guerra, da queda de produção de produtos agrícolas – especialmente grãos e certos derivados, além de fertilizantes – de ambos os países, que estão entre os maiores exportadores de grãos do mundo.
Os países mais pobres, em particular, foram beneficiados: cerca de 64% do trigo foi para países em desenvolvimento, enquanto o milho foi exportado quase igualmente para países desenvolvidos e em desenvolvimento.
A iniciativa incluía partidas de carga dos portos ucranianos de Odessa, Chornomorsk, Yuzhny/Pivdennyi. No entanto, as inspeções de navios com destino à Ucrânia para carregamento de produtos diminuíram consideravelmente desde março, fazendo cair o ritmo das exportações. Essas inspeções foram realizadas principalmente por agentes russos para garantir que mercadorias não autorizadas não fossem transportadas.
As principais reivindicações que a Rússia considera não satisfeitas são a reconexão de seu banco agrícola, o Rosselkhozbank, ao sistema bancário internacional Swift, o fim das sanções sobre peças sobressalentes para máquinas agrícolas, o desbloqueio de logística e seguros de transporte e o descongelamento de ativos.
Rússia nega que saída tenha relação com ataque
Após a ONU se manifestar, a Rússia confirmou a decisão de se retirar do acordo. "Na verdade, os acordos do Mar Negro deixaram de ser válidos hoje", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a repórteres. "Infelizmente, a parte desses acordos do Mar Negro em relação à Rússia não foi implementada até agora, então seu efeito foi encerrado."
"Assim que a parte russa dos acordos for cumprida, o lado russo retornará à implementação deste acordo, imediatamente", completou Peskov. O porta-voz negou que a decisão de não renovar o acordo esteja relacionada a um ataque contra a ponte entre a Rússia e a Crimeia ocupada, que foi atribuído às forças ucranianas.
O chefe das Nações Unidas cita que havia discussões em curso sobre alternativas para sanções impostas, parte das exigências do governo russo para renovação do acordo.
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