Fim da meia-entrada é passo atrás

Um grupo de artistas ligados ao que se convencionou chamar de sertanejo universitário esteve em Brasília para manifestar seu apoio ao governo Bolsonaro e, o principal item da pauta, pedir o fim da meia-entrada em espetáculos culturais no país. Ideia no mínimo impopular, principalmente num país habitado por uma massa tão carente de teatros, cinemas...e renda.

A concessão da meia-entrada está prevista na lei federal 12933/2013 e se destina aos estudantes, pessoas com deficiência e jovens de baixa renda com idade entre 15 e 29 anos. Pessoas com deficiência e, quando necessário, seus acompanhantes, também têm direito ao benefício. O Estatuto do Idoso também prevê o benefício para pessoas acima dos 60 anos.

Sertanejo é um ritmo muito popular no Brasil. O sertanejo universitário, uma moda mais, digamos, nutella, atrai multidões. Portanto, falta de público não é o problema para esses artistas que, se já não estão ricos, estão a caminho da fortuna.

Portanto, a meia-entrada, definitivamente, não é o problema. Em quê, exatamente, o benefício prejudica o faturamento das duplas sertanejas? Em nada. Os artistas recebem o cachê combinado, sem um centavo a menos. Então, por qual razão esses artistas se mobilizaram?

Sigamos o dinheiro. Uma pista pode ser achada na organização do movimento de ontem : quem mobilizou o grupo foi a Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), órgão que reúne os principais contratantes de shows do país. Simples e muito fácil entender. Meia-entrada atrapalha os lucros da galera.

A Cultura no governo Bolsonaro vai aos trancos (muitos) e barrancos (inúmeros). O auge foi o discurso de estética e conteúdo nazista do ex-secretário Alvim. A atriz Regina Duarte, hoje encarnando o papel de “noiva” do governo, é a esperança para arejar o ambiente, dada sua trajetória no teatro, televisão e cinema.

Mas, com medidas tão antipáticas como o possível fim deste benefício, o acesso aos shows ficará muito mais difícil aos jovens estudantes, às pessoas com deficiência e aos idosos. Brasileiros que, na concepção cínica desses artistas, não devem ter direito à cultura. Que fiquem confinados em casa.

Se ficassem apenas na demonstração de apoio ao governo, tudo estaria certo. É um direito deles. Mas foram além, e aí pisaram na bola, ops, na viola. O presidente não se comprometeu em levar adiante a ideia. Disse que vai fazer consultas sobre a constitucionalidade de tal medida. Mas o pedido foi feito, e pegou mal.

O contraste vem de São Paulo, onde o governador João Doria fez uma cerimônia de premiação e reconhecimento a artistas, como Juca de Oliveira. Para marcar ainda mais a diferença de tratamento dispensado à cultura, o governador fez um discurso em defesa da liberdade de imprensa, da criação artística e da democracia. O fim da meia-entrada vai ser um passo atrás.

 

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