Dez anos sem Mc Daleste: relembre vida e morte do artista

No auge da carreira, em 2013, Daniel Pedreira Sena Pellegrini, de 20 anos, foi morto durante show em Campinas

Dez anos sem Mc Daleste: relembre vida e morte do artista - arquivo pessoal


O cantor Daniel Pedreira Sena Pellegrini, conhecido como Mc Daleste, nasceu e cresceu na favela Jau, na Penha, zona leste da capital paulista. Em 2013, Daleste era um dos principais nomes em ascensão do funk. Entretanto, teve sua vida interrompida após ser baleado durante um show no CDHU San Martin, em Campinas.


Caso

Com um público estimado em cinco mil espectadores, Daleste se apresentava sobre uma carreta improvisada quando foi atingido por dois tiros. O primeiro deles foi de raspão, na área da axila, o outro entrou no lado esquerdo do corpo e o atingiu no estômago, fígado e pulmão.

Na hora, o cantor foi socorrido ainda consciente por amigos. Entretanto, não resistiu aos ferimentos e morreu na madrugada do dia 7 de julho, no Hospital Municipal de Paulínia (SP), cidade vizinha daquela em que se o show ocorria.

Investigação

Muitas hipóteses surgiram sobre autoria e motivação para o crime, desde histórias de envolvimento amoroso do funkeiro com a companheira de criminoso até uma possível rixa com outro MC. Os investigadores , no entanto, não chegaram a nenhuma conclusão sobre o assassinato.

Para a polícia, os disparos foram feitos a 40 metros de distância do palco e teriam partido de uma área ao lado de uma casa que estava em construção - perto de um matagal por onde o suposto criminoso poderia ter fugido. Diante desse cenário, acredita-se que o crime tenha sido premeditado, visto a dificuldade de se acertar uma pessoa de longe, em movimento e diante de tantos espectadores.

As investigações foram encerradas em abril de 2016.

Carreira

Daniel começou a carreira com o "funk proibidão", aquele com letras sobre sexo, drogas e violência. Já com maior visibilidade, Daleste passa a cantar o chamado "funk ostentação", com composições sobre bens materiais, como carros, motos, óculos, roupas de marca e bebidas. 

Além disso, Daleste também colaborou com o"funk consciente" - que são composições que falam da esperança por dias melhores, problemas sociais e a vitória da periferia diante dos obstáculos. Na música "Mãe de Traficante", por exemplo, o artista expõe o sofrimento de uma mãe ao ver seu filho envolvido com o crime, a composição se encerra no trecho "a vida do crime não compensa, pare e pensa".

Já na canção "O Gigante Acordou", o MC aborda a questão do aumento da tarifa do transporte público (que resultou em diversas manifestações naquele ano). Nessa canção, Daleste faz diversas referências ao Hino Nacional Brasileiro. Parte marcante é o trecho "aumenta a lei de condução cadê o aumento dos nossos salários | Violência é a tarifa | Eu sou protestante coração valente | Na selva de pedra eu grito o que só vai depender da gente".

Além dessas músicas, o Mc ficou famoso pelos hits "Gosto Mais do Que Lasanha", "Angra dos Reis" e "Nunca Vendeu Maconha".

Importância para São Paulo

O estilo musical funk, até então, estava muito relacionado às periferias cariocas, Daleste foi um dos precursores de uma identidade paulista no gênero. Sobre o assunto, o palestrante e estudante de Ciências Sociais da USP, Thiago Torres (conhecido como o Chavoso da USP), explica que o funk "não se restringe ao ritmo musical, mas é todo um movimento cultural marginalizado, que vai contra a cultura dominante".

Nesse sentido, Daleste contribuiu não só para uma cultura funkeira, mas, também, para uma cultura contra-hegemônica e uma cultura de São Paulo. Não à toa, o Dia Estadual do Funk, sancionado em 2016, é no dia 7 de julho (data de seu falecimento), em sua homenagem.

Thiago Torres, que mora na região da Brasilândia, se recorda que quando pequeno passou a ouvir o funk de "maneira natural" porque "quando a gente está numa favela a gente vai ouvir funk querendo ou não. Não só funk né? Mas o forró, sertanejo, música gospel. A favela é muito musical, e as pessoas gostam de música alta então a gente vai ouvir de qualquer jeito". Foi dessa maneira que a música de Daleste chegou a Torres e a tantas outras pessoas: pela influência de seu entorno periférico.

O palestrante acrescenta que Daleste cativou a população das regiões periféricas porque havia uma identificação e inspiração no MC. 

Torres elucida que a vida da população periférica é pautada no trabalho e que, muitas vezes, não há lazer. Por isso, quando uma pessoa que cresceu no contexto periférico chega a posição de destaque, "ela já vai automaticamente virar uma referência e vai ser extremamente valorizada, vai ser uma pessoa que vai mostrar alguma direção pros demais".

Legado

Daniel Pedreira Sena Pellegrini, o Mc Daleste, deixou um legado à nova geração do funk. É o que defende o Mc Yoshi - artista que lançou sucessos ao lado de Daleste, sendo um deles, inclusive, póstumo. "A gente vê a importância e a relevância do Mc Daleste no cenário do funk de diversas formas. Por exemplo, nós temos uma geração que cresceu escutando MC Daleste. Que é a geração do MC Kevin", diz o artista.

MC Kevin, autor do hit "Cavalo de Troia" e falecido em maio de 2021 devido à queda de uma sacada de hotel, cita Daleste na música "Inspiração". Kevin não foi o único a homenagear Daleste em canções, a cantora Glória Groove emplacou o sucesso "Vermelho" com um trecho da música "Mina de Vermelho", de autoria de Daleste. O Mc Hariel, por sua vez, em conjunto com o Dj Wilton lançou a canção "Garota Nível A" no dia 7 de julho de 2021, esta foi a última música produzida por Daleste em vida e permaceu guardada durante oito anos.

"Ele teve uma importância mais do que relevante no cenário do funk", finaliza Mc Yoshi.