Vacina e política

Vacina e política - Divulgação/Governo de SP


Vacinas, por princípio, deveriam ser tratadas como uma questão científica e técnica e não ideológica. Científica por envolver pesquisas, investimentos públicos e privados, aferição de resultados, publicações e uma extrema precaução na condução conjunta de todos estes fatores. Técnica por dizer respeito a como se concretiza essa pesquisa através de procedimentos visando à produção em massa de seus resultados, além, evidentemente, de todo um sistema de conservação das vacinas e de sua aplicação em todos os recantos do país.


Tal procedimento não pode, então, estar subordinado a concepções ideológicas que de ciência nada sabem, visando apenas impor uma mentalidade política, de poder, desvencilhada de qualquer preocupação verdadeira para com o bem público. No sentido nobre da política, a vacina e campanhas de vacinação deveriam estar voltadas para a saúde de todos, evitando e controlando pandemias e diferentes formas de contaminação coletiva.

Exemplo Bolsonaro. Enquanto exemplo de um comportamento ideológico de tratamento da vacina, temos o presidente Bolsonaro, que tudo faz em seus discursos e manifestações para posicionar-se contra a vacina contra o COVID. Inventou um tal de tratamento precoce que foi propagandeado por todo o país, desperdiçando recursos públicos com medicamentos reconhecidamente ineficazes para tal doença. Primeiro, a minimizou como se fosse uma gripezinha qualquer e não cansou durante este doloroso período de pronunciar-se contra a ciência. O negacionismo foi a sua marca. Segundo, os resultados foram catastróficos, tendo o país agora chegado a mais de 621 mil mortos. Não fosse o SUS e as compras de vacinas que o próprio governo propiciou, contrariamente à sua própria narrativa, a situação poderia ter sido ainda pior. Chegou, inclusive, a retardar a compra de vacinas. Procurou de todas as maneiras impor a sua concepção da política, de fato voltada para a morte e não para a conservação da vida.

Exemplo Doria. Não fosse o governador João Doria, o país teria ainda mais sofrido. Graças à compra de vacinas Coronavac e, logo, à importação de insumos para a sua produção no país, o Brasil pode se habilitar à luta contra a pandemia. Enquanto o atual presidente vociferava contra a vacina, falava do vírus chinês, o governador comprou a vacina chinesa, que passou a ser produzida pelo Instituto Butantã, com todo o seu apoio. Parecia uma luta ideológica, envolvendo diferentes concepções da China, quando a questão era de outro tipo, a saber, a de uma política orientada pela morte e a de uma política orientada pela vida. A primeira tendo como norte a busca incessante de inimigos a serem destruídos, reais ou imaginários; a segunda, orientada por valores democráticos e, sobretudo, científicos. No caso, uma política orientada pela ciência na consecução de objetivos, dentre os quais o mais importante naquele momento foi o da saúde da população brasileira. 

Ensinamento. Dentre outros ensinamentos deste difícil processo de enfrentamento da pandemia, está o de que o país não pode ficar refém somente de insumos externos, mas deve partir de uma forma muito mais decidida para aumentar a pesquisa no país, voltada para a produção de vacinas e medicamentos. Dever-se-ia construir uma espécie de cadeia produtiva da saúde, envolvendo universidades públicas e privadas, laboratórios públicos e privados, agências de fomento e assim por diante. Urge que uma política responsável nacionalmente possa responder a emergências sem depender de outros países, que, também eles, atendem primeiramente os seus próprios cidadãos. O altruísmo, infelizmente, não faz parte da política. Os cidadãos exigem que os seus impostos sejam gastos pelo Estado tendo-os como prioridade. Assim é, gostemos ou não. Eis, portanto, uma questão que deveria fazer parte do debate presidencial que ora começa.