SBT analisa “Luca”, dos estúdios Pixar: uma animação sobre liberdade e identidade

Filme está disponível no catálogo do Disney+

SBT analisa “Luca”, dos estúdios Pixar: uma animação sobre liberdade e identidade -


A nova animação do estúdio Pixar marca a estreia do diretor Enrico Casarosa, já indicado ao Oscar pelo curta “A Lua” (2011) e creditado como artista visual em filmes como “Up: Altas Aventuras” (2009) e “Viva: A Vida é uma Festa” (2017), em longas metragens. O diretor, bem como no curta de sua direção já supracitado impõe todo seu charme europeu e memórias de infância pra compor seu novo filme.

O conto de fadas italiano acompanha Luca, dublado por Jacob Tremblay, um jovem e disciplinado monstro marinho que vive, abaixo d’agua, claro, próximo a uma cidade costeira e conhecida pela mitologia da ameaça que são as criaturas marinhas fantásticas. Tendo uma rotina de criança interiorana, as dinâmicas submarinas são similares as terrestres, pastoreando peixes que personificam ovelhas e sempre longe dos barcos humanos, pois a mitologia de perigo entre ambas as espécies é a mesma. É quando se deita para dormir ao lado da avó que narra experiências incríveis que viveu no mundo dos humanos, que Luca vislumbra as maravilhas proibidas da superfície, sonho que é, sempre que possível repreendido verbalmente de forma muito incisiva pela mãe (Maya Rudolph), o que apenas instiga mais o garoto a desejar conhecer o desconhecido. Durante suas horas de tédio como pastor de “peixes-ovelha” Luca se depara com objetos naufragados como cartas de baralho, uma vitrola e assim, cada vez mais a curiosidade do garoto pela da superfície aumenta.

Mas é quando conhece Alfredo (Jack Dylan Gracer), outro jovem monstro marinho que tem muito mais familiaridade com a terra por morar sozinho em uma torre abandonada, que a mera curiosidade se torna um completo desejo, e em um ato impulsivamente metalinguístico Luca se deixa ser puxado, literalmente, para fora de sua zona de conforto. Para conseguir passar despercebido pelo mundo dos humanos, a escolha criativa do longa é assertiva: quando secos, as criaturas, já humanoides, se transmutam em  pessoas comuns, porém ao mero contato com água, as escamas e barbatanas se revelam, detonando a verdadeira forma de nossa dupla, fato que gera inúmeras situações cômicas. Desde o primeiro momento em terra, a ligação dos dois garotos se torna verdadeiramente forte, onde por viver sozinho, Alberto, dizendo que o pai fora viajar, “ensina”, a sua maneira, como o mundo seco funciona à Luca, dizendo que as estrelas são peixes nadando em um vasto oceano escuro, que escola é desnecessária ou para que deixe de ouvir o Bruno, a voz interior que nos faz sentir medo de fazermos algo que queiramos.






A partir daí, Luca, tenta de todas as formas escapar das funções familiares para ter experiências completamente novas em um mundo todo a ser explorado. Por óbvio, a mãe, superprotetora, descobre o plano do filho e decide enviá-lo às profundezas para morar com o tio (Sacha Baron Cohen) dublando Borat em um peixe. Luca se revolta com a decisão familiar, somado isso ao o sonho de ter uma Vespa (scooter italiana) para poder viajar o mundo com o mais novo melhor amigo, o jovem anfíbio (?) foge de casa e embarca na aventura fantasiosa em questão.  

Chegando à cidade Portorosso, a dupla se torna trio, quando após serem intimidados pelo nosso “vilão”, e uso aspas pelo personagem não conter maldade em si, mas apenas ser um adolescente odiosamente mimado, Ercole Visconti (Saverio Raimondo), que somos apresentados a Giulia(Emma Berman) uma garota excluída que sonha em vencer a copa da cidade, composta por um triatlo de natação, ciclismo e comer massas, para provar aos outros, que a dizem o contrário, que ela pertence àquele ambiente. A garota, rapidamente se identifica com os meninos, “adota” ambos para residirem em sua casa com o pai, um pescador bronco, Massimo (Marco Barricelli) e com motivações que se complementam, pois o prêmio em dinheiro possibilidade a compra de uma Vespa, unem forças e forma o time que participará da competição.

“Luca“ é essencialmente um filme sobre liberdade e identidade, sendo a primeira, certamente personificada pela imagem da Vespa, tão cobiçada pelos jovens garotos que são incompreendidos tanto na água quanto na terra. Já a segunda nos é apresentada de forma sutil durante toda a narrativa, sendo pelo falso amor que Ercole recebe, por ser o campeão do tão requerido campeonato, que não passa de uma falsa afeição, bem como a de Gaston de “A Bela e a Fera”, aliás outro filme sobre identidade, que provém da intimidação criada pelo personagem. Na superfície, “Luca” é uma animação sobre monstros marinhos tentando se camuflar em meio a comunidade pescadora de Portorosso, porém em um senso mais profundo, vemos um drama de personalidades, como o de Alberto que, a princípio se mostra um garoto extremamente confiante que apenas usa do artificio para mascarar sua fragilidade pela perda do pai e insegurança conforme Luca se aproxima cada vez mais de Giulia, temendo novamente o abandono e a solidão. Narrativa a qual fica deslocada em meio à rodagem, não havia necessidade de mais um ciclo de amizade ali, onde o que já estava, muito bem, estabelecido era o enfoque principal, o que gera uma digressão que incomoda, porém corrigida no trecho final do longa e da corrida em si, onde o filme sabe indicar a importância de determinados personagens para causar o impacto necessário, onde a, obviamente, vitória do trio, mais da dupla, não é apenas deles, mas também de quem assiste.

O filme certamente tem seu charme, principalmente no seu visual estético, majoritariamente pela escolha das cores e pelo trabalho de pesquisa envolvido na criação daquele ambiente tão verossímil, porém não propõe nada que o estúdio já não tenha feito anteriormente e de forma mais eficaz, tanto visual, quanto narrativamente. “Luca” é bem menos ambicioso em sua narrativa do que filmes como “Divertidamente” (2015) ou “Wall-E” (2008) e devido a isso consegue, mesmo que não completamente se desvincular da, chamada, “fórmula Pixar”, o que de um ponto de vista mostra a liberdade criativa que o estúdio disponibilizou nas mãos de Casarosa. Por outro lado, tendo uma criação de problemática célere demais e uma conclusão mais apressada ainda, “Luca” mesmo podendo tocar pessoas que se identifiquem com algum dos personagens, é, até agora, o filme menos emocionalmente carregado do estúdio.

Nota do Crítico: 6.5

Nota Média do Público (IMDb):7.6

Comentários